A ideia de passar horas, dias e até semanas tentando resolver um único problema matemático parece um pesadelo. Mas não para o medalhista da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), o alagoano Jairon Henrique Noia Batista, que encara este tipo de desafio como algo “extremamente prazeroso e gratificante”. Não surpreende que o grande sonho do estudante de 17 anos seja se tornar um pesquisador científico na área. Há cerca de dois meses, ele deu um importante passo em direção a esse objetivo: ingressou na graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro, no curso de matemática aplicada.
Nascido em Maceió, o medalhista se mudou com a família para União dos Palmares, município ao Norte da capital, aos oito anos. Desde muito novo, o afinco nos estudos chamou a atenção de seus pais, Clarice e Jairon, e de seus professores. No início do ensino fundamental, diante da evidente aptidão que o menino tinha para a matemática, um dos docentes da escola o convidou para participar da Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM).
O garoto não conseguiu conquistar prêmios na competição, mas sua participação se provaria um importante treinamento para a OBMEP, na qual se inscreveu pela primeira vez em 2017 - foi o ano da adesão das escolas particulares. “Estava muito ansioso e esperançoso de conseguir alguma coisa. Já tinha participado da OBM por três anos, mas as questões eram muito difíceis”, lembra Jairon.
Para que pudesse comparecer aos exames, por vezes aplicados na capital, a família toda, que gerencia uma mercearia, teve de se envolver. “Muitas vezes, as provas eram aos sábados, e nós tínhamos que estar na loja. Mas sempre dávamos um jeito de levar o Jairon para participar, porque sabíamos o quanto isso era importante para ele”, comenta o pai.
Do esforço veio a recompensa. Nas três edições que participou da OBMEP, o alagoano conquistou uma menção honrosa, uma medalha de prata e outra de bronze. O sonhado ouro foi impactado pela pandemia da Covid-19, que acabou adiando a edição de 2020 da OBMEP, conta o jovem.
Mestre e doutor pelo IMPA, Alan Pereira conheceu o estudante num “acampamento matemático” que realizou com medalhistas. O professor, que atualmente leciona na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), relembra que Jairon se destacava pela percepção apurada que tinha dos aspectos formais da disciplina.
“O Jairon me lembra um tipo de aluno que o Emanuel Carneiro descrevia como o melhor: aquele que consegue identificar o que não entende de um determinado assunto. Percebe a dificuldade das coisas e não se intimida”, exalta. “É uma percepção de formalidade muito difícil de se ter nesta idade, e é uma grande característica dele.”
A relação com o professor da UFAL se estendeu ao longo do ensino médio, quando Jairon passou a ter ainda mais contato com a comunidade olímpica. Além de frequentar semanalmente a casa do professor, para resolver listas de exercícios de competições científicas, o estudante participava de atividades como o Programa de Iniciação Científica (PIC) Jr e o Polos Olímpicos de Treinamento Intensivo (POTI), onde fez grandes amizades.
“Adoro o ambiente da comunidade de olimpíadas científicas. Conheci a maioria dos meus amigos neste meio. Principalmente, quando fui aluno do Instituto Federal de Alagoas (IFAL), que é um grande centro de medalhistas. Lá conheci pessoas que adoram desafios e gostam de passar uma tarde inteira em algum problema.”
Com a pandemia, o último ano do ensino médio foi conturbado para o medalhista. Além de estudar para o vestibular da FGV-Rio, ele treinou para a olimpíada e cursou, “com muito esforço”, algumas disciplinas dos cursos de verão da UFAL e do IMPA. “O curso de verão do IMPA é bem famoso, e todo mundo fala que é uma ótima oportunidade para aprender algumas matérias mais avançadas. Por indicação do professor Krerley Oliveira (UFAL), acabei optando pelo curso de cadeias de Markov”, narra Jairon.
A família recebeu com festa a notícia da aprovação para a graduação em matemática aplicada da FGV-Rio. “Foi uma alegria muito grande. Ele conseguiu uma ótima colocação. É realmente um orgulho para nós”, emociona-se o pai. Há dois meses no curso, realizado, por ora, à distância, Jairon afirma estar concretizando um grande sonho. “Está sendo maravilhoso. Sempre soube que queria ser matemático. Acho divertido olhar padrões e ver como o mundo funciona a partir disso. A matemática é uma linguagem capaz de explicar o funcionamento das coisas.”
Como bom medalhista, o alagoano não hesitou em se lançar nos desafios da vida universitária. Ele integra um laboratório de estatística e ciência de dados formado por estudantes da FGV-Rio e da UFAL. Dentro do grupo de pesquisa, tem se dedicado a identificar dados de vacinação do coronavírus no Brasil. “Comecei coletando dados abertos como, por exemplo, quem tomou a segunda dose em dia e quem tomou atrasado. A ideia é criar um painel com todas as informações, que pode servir para informar a população e ajudar na organização de compras de vacina”, explica, entusiasmado.
A família agora convive com o “frio na barriga” com a iminente mudança do filho para o Rio, o que deve acontecer quando a pandemia arrefecer. O pai espera que Jairon tenha sucesso no seu caminho como pesquisador, e consiga transmitir o conhecimento adquirido para a sua comunidade. “Ele sempre teve essa generosidade com os colegas. Nos treinamentos das olimpíadas, ensinava várias questões para os amigos que estariam competindo com ele alguns dias depois”.
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